Período regencial: a abdicação de D. Pedro I


O cenário político brasileiro durante o reinado de D. Pedro I era um pouco confuso e agitado. Por causa da Constituição outorgada de 1824 e das agitações liberais crescentes na época, principalmente na Europa, o Brasil passou por um período bem conturbado em sua História.

Antes de falar do período regencial, nós precisamos entender os antecedentes do processo e qual o papel dos protagonistas da política brasileira nesta época.

Recomendamos também o nosso texto sobre o processo de independência do Brasil, pois este texto aqui é quase que uma continuação.

A Constituição de 1824 e o Poder Moderador

D. Pedro I não aceitou a primeira Constituição elaborada pela Assembleia Constituinte, que foi convocada em 1823, pois a mesma limitava seus poderes enquanto imperador. Um Conselho de Estado foi convocado após D. Pedro dissolver a Assembleia e este Conselho elaborou a Constituição, que foi outorgada - ou seja, imposta - por D. Pedro no dia 25 de março de 1824, sem qualquer discussão ou interferência externa ao Conselho.

Mas apesar desta Constituição implantar o Poder Moderador, que dava plena liberdade de ação ao imperador, havia - além dos Poderes Executivo e Judiciário - o Poder Legislativo, exercido pelos deputados e senadores, eleitos segundo o voto censitário, pois só podia votar quem tivesse uma renda específica, os pobres estavam de fora do processo eleitoral.

Entre estes deputados e senadores existiam membros favoráveis à atual situação administrativa do Brasil e também aqueles membros contrários tanto aos supremos poderes do imperador - concedidos pelo Poder Moderador - quanto contra a manutenção da própria monarquia. Estes eram os liberais, elementos da sociedade que causavam maior dor-de-cabeça a D. Pedro I.

Mas como estes elementos eram eleitos e respaldados pela Constituição, tanto D. Pedro quanto o Conselho de Estado, formado em sua maioria por simpatizantes da monarquia e pessoas próximas ao imperador, tinham que aturar os liberais e vez ou outra bater-boca para resolver os impasses sem causar muitos danos à ordem estabelecida.

D. Pedro ainda estava meio acuado frente a uma situação no mínimo inusitada: ainda existiam pessoas no Brasil, a maioria portugueses e membros do Partido Português, que desejavam que o país voltasse a ser colônia de Portugal. E estas pessoas também faziam parte da corte e dos círculos próximos à coroa, além das pessoas “comuns” - comerciantes, trabalhadores etc… - que tinham o mesmo desejo.

Agora imaginem a situação de D. Pedro I desde a Independência:

- Portugal atrapalhando o jogo e não reconhecendo a independência do Brasil;
- Um bando de ingleses perambulando pela corte e parasitando por estas bandas, além de grande parte do nosso comércio estar atrelado a eles;
- Uma quantidade considerável de portugueses vivendo aqui no Brasil, sem condições ou sem interesse em voltar a Portugal e desejando a volta do Brasil para a condição de colônia ou reino unido, o que fosse melhor, pois país independente era uma situação inaceitável para estas pessoas;
- E entre os brasileiros, os nacionalistas, uma parte que era favorável à manutenção da monarquia, mas outra parte queria ver D. Pedro longe do poder (esse grupo era conhecido como os "exaltados"), ou pelo menos que o Parlamento tivesse mais força que o imperador (estes eram conhecidos como os "ximangos").

Era muita opinião divergente e muita gente dando palpite. Qualquer um ficaria maluco… ou abdicaria.


Outros problemas atrapalhavam o reinado de D. Pedro I:

Enquanto país recém-independente, as outras nações tinham que reconhecer o Brasil como um país soberano, o que acabava gerando pequenos atritos diplomáticos. Os gastos militares do Brasil na guerra contra as Províncias Unidas do Rio da Prata também causou certo desconforto nos parlamentares.

As dificuldades financeiras internas começaram, na verdade, desde o dia em que D. João VI limpou os cofres do Banco do Brasil e voltou para Portugal.

D. Pedro, sem ter muito o que fazer e tendo uma queda de arrecadação por conta de uma baixa quase geral nos preços das exportações mais para o fim da década de 1820, mandou o Banco do Brasil emitir mais dinheiro, o que gerou uma espiral inflacionária e forçou a liquidação deste banco em 1829, agravando a crise.

Os liberais ganharam força após a Revolução de 1830, que derrubou Carlos X na França. Apesar da distância, os ideais liberais desta manifestação francesa espalharam-se por muitas outras nações ao redor do mundo, principalmente aqui na América. No Brasil a notícia foi recebida com entusiasmo pelos liberais, que iniciaram manifestações para derrubar com o Poder Moderador.

Nesta época existiam, entre tantas, duas grandes vozes liberais no país que estavam bem próximas ao Império: Evaristo da Veiga, que era responsável pelo jornal carioca “Aurora Fluminense” e Libero Badarò, fundador e redator do jornal “O Observador Constitucional”, de São Paulo.

Badarò, após apoiar a manifestação de estudantes paulistas que simpatizavam com a causa liberal e de atacar, a partir do jornal, o ouvidor Cândido Japiaçu, que havia processado alguns dos estudantes, foi morto por supostos capangas de Japiaçu.

O assassinato de Badarò deixou os ânimos inflamados e outros protestos tomaram conta das ruas das principais cidades do Brasil. Eram protestos modestos, de uma pequena parte da população, mas atrapalhavam a ordem estabelecida pela Constituição de 1824. Em fevereiro de 1831, D. Pedro foi até Minas Gerais, a fim de acalmar os ânimos exaltados por Bernardo Pereira de Vasconcelos, jurista e jornalista que também tomou frente nas manifestações liberais.

Na volta para a capital, em 11 de março, D. Pedro foi recebido por portugueses interessados na volta do Brasil submisso à coroa portuguesa. Na verdade houve uma festa, e os nacionalistas, irritados com os gastos da festa, já que o país estava em crise, entraram em atrito com os portugueses, o que resultou na noite das garrafadas, uma briga generalizada pelas ruas do Rio de Janeiro.

D. Pedro I, após o ocorrido, ao invés de tentar acalmar os ânimos, destituiu seu ministério - que era formado em sua maioria por pessoas moderadas - e nomeou pessoas reconhecidamente favoráveis ao absolutismo e, consequntemente, o Poder Moderador previsto na Constituição. Meio perdido entre protestos que exigiam a volta dos antigos nomes ministeriais e sem o apoio das Armas, pois as tropas aderiram aos protestos, D. Pedro até tentou compor um novo Ministério, mas acabou abdicando ao trono no dia 7 de abril de 1831 com a seguinte carta:

“Usando do direito que a Constituição me concede, declaro que hei muito voluntariamente abdicado na pessoa de meu muito amado e prezado filho o Senhor D. Pedro de Alcântara.
– Boa Vista, sete de abril de mil oitocentos e trinta e um, décimo da Independência e do Império.”

Ao entregar a carta de abdicação para o major Miguel Vasconcelos, comandante da fortaleza da Ilha das Cobras, D. Pedro teria dito: “Aqui está a minha abdicação. Desejo que sejam felizes! Retiro-me para a Europa e deixo um país que amei e que ainda amo.

D. Pedro voltou para a Europa com a imperatriz D. Amélia e a filha D. Maria, deixando no Brasil seus filhos Pedro, futuro imperador, e as meninas D. Januária, D. Paula e D. Francisca. Como o filho Pedro tinha apenas 5 anos e ainda era pequeno para governar, D. Pedro nomeou José Bonifácio como tutor da criança.

Após a abdicação, os políticos brasileiros tiveram que se organizar em torno de uma regência, que ficaria responsável pelo governo até que o pequeno Pedro alcançasse a maioridade. Mas isto é assunto para o próximo texto:

Período Regencial: as Regências Trinas e Unas


Fontes:

– FAUSTO, Boris. História do Brasil. Editora EDUSP. São Paulo, 2008.

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