A Balaiada


Assim como todas as outras revoltas do Brasil imperial, a Balaiada também foi causada pelas demandas sociais do período. Neste caso, o estopim da revolta foi o enfraquecimento econômico da província do Maranhão, que tinha sua economia baseada na pecuária e na exportação de algodão e viu seu principal produto sofrer uma forte concorrência de outro país, neste caso, o algodão norte-americano, lá pelos idos de 1836–1837.

Mas não era só isso, afinal de contas, estamos falando do Maranhão…

A luta pelo poder local

A província do Maranhão englobava três estados atuais: Maranhão, Piauí e uma parte do Ceará. E havia uma forte disputa política na província entre os conservadores, chamados de cabanos — não confundir com os cabanos da Cabanagem, ok? — e os liberais, conhecidos como bem-te-vis.

Assim como ocorreu na Cabanagem, a população local também pegou em armas logo após a independência para enfrentar os portugueses que ainda desejavam a manutenção da província como colônia de Portugal.

E depois da consolidação da independência, a situação sócio-econômica da grande maioria do povo não sofreu qualquer melhoria.

No meio deste jogo político pós-consolidação a população sofria com a disputa. A maioria dos conservadores eram fazendeiros, que faziam valer sua força econômica para influenciar a política da região. E estes mesmos fazendeiros empregavam a maioria dos homens livres — sertanejos que viviam da lavoura e da atividade pastoril, entre outros pequenos ganhos — e, claro, também contavam com parte da mão-de-obra escrava existente na província.

Com a crise do algodão, diminuiu a quantidade de dinheiro que antes circulava pela província; e como não havia muito apoio da capital — como em todas as outras províncias mais isoladas — a população acabou se metendo na disputa política quase como uma forma de sobrevivência naquela situação.

Na época, os conservadores buscavam uma forma de enfraquecer ainda mais os liberais. Com o Regresso Conservador promovido pela regência de Araújo Lima e a Lei dos Prefeitos, que dava autonomia local para que a província nomeasse os governantes, os conservadores faziam pressão para que seus nomes de confiança — ou eles próprios — fossem nomeados para perpetuar os mandos e desmandos na região.

Qualquer semelhança com o cenário político atual daquela região, que começou a ser desmontado com a eleição de Flavio Dino de 2014, não é mera coincidência. Só que naquela época a população não tinha direito a voto e resolveu se rebelar.

O início da revolta

Em 13 de dezembro de 1838, um grupo de vaqueiros liderados por Raimundo Gomes e apoiados pela Guarda Nacional — destacamento formado por cidadãos comuns, que não tinham treinamento militar — invadiu a cadeia de Vila da Manga, que era sub-presidida por José Egito, de orientação conservadora.

A intenção de Raimundo Gomes era libertar seu irmão, que havia sido preso sem um bom motivo aparente, além de também libertar outros presos que ali estavam na mesma condição. O que fez a Guarda Nacional apoiar Raimundo e o grupo de vaqueiros foi também o descontentamento com a política local.

Nesta ocasião, o grupo tomou o controle da Vila e recebeu o apoio do líder quilombola Cosme Bento, que contava com cerca de três mil escravos evadidos a seu lado.

Sabendo do ocorrido, os bem-te-vis até tentaram manipular a situação a seu favor, mas a adesão de Manuel Francisco dos Anjos Ferreira, também conhecido como Manuel Balaio deu o tom altamente popular à revolta, o que não impediu a participação de bem-te-vis no conflito, ao lado dos revoltosos, mas sem o protagonismo que um grupo da elite desejaria ter em uma situação como esta.

Seguiu-se uma série de vitórias dos balaios e a principal delas ocorreu na Vila de Caxias em 1839, segunda cidade mais importante da província, só perdendo para a capital. Conta-se que quando os revoltosos tomaram a cidade, ouvia-se nas ruas o seguinte canto:

“O Balaio chegou!
O Balaio chegou.
Cadê branco!
Não há mais branco!
Não há mais sinhô!”


Os rebeldes logo organizaram um Conselho Militar e formaram uma Junta Provisória, com a participação de elementos bem-te-vis. Uma delegação foi enviada à capital São Luís para entregar ao presidente da Província as propostas para o fim da revolta: anistia para os revoltosos, o fim da Lei dos Prefeitos, expulsão dos portugueses natos e diminuição de direitos aos naturalizados e instauração de processo para os presos existentes nas cadeias, já que a maioria estava ali presa por pensar de forma diferente de algum fazendeiro.

O começo do fim e a repressão de Lima e Silva

Óbvio que o governo da província não aceitou as exigências dos revoltosos. Neste meio tempo, cabanos e bem-te-vis que não estavam contentes com a revolta já estavam quase que falando a mesma língua, interessados no fim dos balaios.

Começaram então a subornar membros envolvidos na revolta, tentando enfraquecer o movimento. Também solicitaram ajuda da capital, e a província logo recebeu o contingente de vários soldados deslocados de outras províncias para reprimir o levante popular. O então coronel fluminense Luís Alves de Lima e Silva — o futuro Duque de Caxias — foi nomeado presidente da província.

Após alguns combates, Lima e Silva concedeu anistia aos revoltosos em 1840, o que provocou a rendição imediata de cerca de 2500 balaios, entre eles Raimundo Gomes, o principal líder, que foi expulso da província.

Dos que restaram, Manuel Balaio e Cosme Bento recusaram-se a aceitar a anistia, sofreram pesada repressão e acabaram mortos. Bento ainda fugiu para o Piauí, mas com o movimento enfraquecido, foi capturado e enforcado em 1842. Todos os escravos fugidos que participaram da revolta e não morreram no combate foram reescravizados.

Em 1841 Lima e Silva já dava como encerrado na província qualquer resquício de manifestação popular contrário ao governo local.

A repressão à Balaiada marcou o início da chamada “política da pacificação”, pela qual Lima e Silva sufocou as principais agitações que ocorreram durante o segundo reinado.

Fontes

- “Balaiada: a guerrilha sertaneja”. Artigo de Claudete Maria Miranda Dias, professora da UFPI.
- “Balaiada: construção da memória histórica”, de Maria de Lourdes Monaco Janotti.
Todos os links foram verificados em 02/12/2019.

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