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Zumbi e Palmares


Dia 20 de novembro nós comemoramos o Dia da Consciência Negra. Nesta mesma data, no ano de 1695, morria Zumbi, um dos maiores expoentes da luta contra a escravidão no Brasil. Ele ficou famoso por comandar o Quilombo dos Palmares, considerado o maior do país.

O quilombo-nação

Os quilombos podem ser definidos como áreas controladas pelos negros - trazidos da África para serem escravos no Brasil - que fugiam do trabalho forçado e assim formavam comunidades que mantinham a resistência contra a escravidão.

Os quilombolas caçavam, pescavam, colhiam frutas, plantavam os alimentos e construíam suas próprias moradias. Não é exagero dizer que um quilombo era auto-sustentável.

Palmares, localizado na região da Serra da Barriga e pertencente ao atual estado de Alagoas, teria sido fundado por volta de 1580 por escravos dos engenhos das capitanias de Pernambuco e Bahia. Chegou a ter, em seu apogeu, quatro grandes mocambos: Macaco — o maior dos quatro e centro político do quilombo — Subupira, Zumbi e Tabocas.

Estima-se que por volta de 1670 Palmares chegou a ter entre 20 e 30 mil habitantes. [E para quem não sabe, mocambo nada mais era que uma aldeia, um núcleo populacional]

Como o território brasileiro nesta época era povoado em grande parte nas áreas litorâneas, os escravos acabavam fundando os quilombos em áreas mais no interior, como foi o caso de Palmares. Organizavam-se de maneira bem parecida com as tribos africanas, mas como vieram para o Brasil membros de diversas tribos — bantos, yorubás, ashantis, entre outras — o foco principal era a proteção mútua, independente da tribo que a pessoa fazia parte na África antes de ser capturado.

Os portugueses chamavam o quilombo de “República dos Palmares”, que resistiu a diversas investidas militares, tanto de portugueses, quanto de holandeses — que dominaram parte do Nordeste entre 1630 e 1654. Em uma destas investidas, em 1675, Zumbi se destacou como grande líder militar ao comandar a defesa contra os portugueses.

Pintura retratando luta entre grupo de negros (ex-escravos) e grupo de brancos (provavelmente bandeirantes).

Zumbi e seu legado

Zumbi nasceu livre, em Palmares, no ano de 1655. Era descendente do povo imbamgala, de Angola. Quando tinha 7 anos, foi capturado por soldados portugueses e entregue ao padre Antonio Melo, que batizou o garoto, deu-lhe o nome de Francisco e cuidou de sua educação ensinando português, latim e os preceitos católicos. Francisco teria inclusive ajudado o padre na celebração das missas, após os 10 anos de idade.

Com 15 anos, Francisco fugiu das tentativas de aculturação e voltou para Palmares, adotando o nome de Zumbi. Com o tempo, aprimorou sua destreza na luta e surpreendia seus pares com suas estratégias na defesa do quilombo.

Em 1678 o governador da capitania de Pernambuco, Pedro de Almeida, propôs anistia e liberdade a todos os quilombolas, desde que eles jurassem fidelidade à Coroa portuguesa. O líder Ganga Zumba[1] aceitou o acordo, mas tanto Zumbi quanto muitos outros quilombolas não aceitaram a liberdade enquanto outros negros continuavam escravos nas fazendas.

Zumbi então tomou a liderança de Palmares após o assassinato de Ganga Zumba e organizou ainda mais o quilombo. É durante sua liderança que Palmares chega ao seu apogeu, inclusive rechaçando com sucesso dezenas de tentativas de destruição por parte dos portugueses.

Em 1692 o bandeirante Domingos Jorge Velho organizou uma expedição com objetivo de destruir Palmares, contando com o apoio de 6 mil homens e uma artilharia pesada para a época. O quilombo foi sitiado mas manteve dura resistência até 1694, quando o mocambo de Macaco foi invadido pelas tropas de Velho.

Zumbi (ferido) e um grupo de aproximadamente 20 quilombolas que lutavam junto a ele conseguiram fugir pela mata, resistindo por mais de um ano atacando vilas portuguesas.

Em 20 de novembro de 1695 Zumbi foi localizado e cercado pelas tropas portuguesas. Conta-se que foi traído por um antigo companheiro de quilombo, Antonio Soares, que contou para as tropas sua localização.

Ele foi morto, esquartejado, sua cabeça foi salgada e mandada para Recife, onde foi exposta em praça pública. A intenção era provar a todos que Zumbi não era imortal, ao contrário dos boatos que corriam na época.

Zumbi é lembrado não só pela resistência contra a escravidão, mas também por defender a liberdade dos negros… de TODOS os negros. Sua atitude de manter a resistência mesmo com a liberdade garantida, pelo menos para os quilombolas, é louvável.

Na África as pessoas viviam separadas por tribos, e é claro que haviam desentendimentos e conflitos entre várias tribos, assim como também existiam relações amistosas e cordiais entre outras. Inclusive existia escravidão entre tribos, mas a escravidão africana era completamente diferente da escravidão aplicada deste lado do Atlântico. Lá em muitos casos o escravo podia até se casar com alguém da tribo que o escravizou. Por isso, uma vez capturados e feitos escravos pelo homem branco, era fundamental manter a união em terras estrangeiras. Os portugueses, inclusive, costumavam misturar negros de diversas tribos diferentes, justamente para evitar a união dos escravos e uma forte resistência.

Zumbi foi além dos problemas que existiam entre as tribos africanas, e desejou a liberdade para todos que estavam no mesmo barco, sofrendo do mesmo jeito o mesmo problema.

Notas

[1] Ganga Zumba, ou Nganga Nzumbi, provavelmente era um título dado ao líder do quilombo. Segundo o historiador Pedro Paulo Funari, nganga significa “sacerdote”, e nzumbi “possui conotações militares e religiosas”. [fonte]

- Deem uma lida neste texto sobre o Quilombo dos Palmares no site do departamento de História da UFF.

- Leiam a HQ "Angola Janga", trabalho PRIMOROSO do Marcelo D'Salete sobre Palmares.

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