Hunters (1a temporada)


Estreou recentemente (fev-2020) a série "Hunters" no serviço de streaming da Amazon. Nós já assistimos e vamos contar aqui - com spoilers beeem leves - o que achamos da primeira temporada, o que é ficção, exageros e, principalmente, o que podemos tirar de aprendizado para os dias atuais.

Vamos lá:

Judeus versus nazistas... nos EUA dos anos 1970?

A série tem uma premissa "simples": a Segunda Guerra acabou, nem todos os colaboradores de Hitler morreram ou foram presos após a guerra, então um grupo de judeus sobreviventes do holocausto - ou descendentes destes sobreviventes - que vivem nos EUA, 30 anos depois, resolveram caçar estes nazistas.

A partir daí a série usa fatos reais - e alguns exageros - para contar esta história. E por citar novamente, estes exageros, vamos logo tirar o bode da sala: é fato que milhões de judeus morreram nos campos de concentração nazista. E muitas vezes de forma cruel. Mas tem pelo menos uma situação na série que foi inclusive criticada pelo Memorial de Auschwitz, a cena em que um oficial nazista e um preso disputam uma partida de "xadrez humano".

Segundo o Memorial, "Auschwitz era cheia de uma dor horrível e um sofrimento documentado nos relatos de sobreviventes. Inventar um jogo falso de xadrez humano para Hunters não é apenas uma loucura e uma caricatura perigosas. Também acolhe futuros negadores. Honramos as vítimas, preservando a precisão factual". [fonte]

Confesso que este detalhe não me incomodou, talvez por se tratar de uma trama sabidamente ficcional, mesmo sabendo que existem judeus caçadores de nazistas no pós-guerra (abração, Simon Wiesenthal!) e que vários nazistas fugiram como baratas para as Américas assim que os russos bateram às portas de Berlim. Mas vale o registro, principalmente pela observação feita na nota, de que tal representação "acolhe futuros negadores [do holocausto]".

Pois bem, voltemos à trama.

Al Pacino é Meyer Offerman, líder e financiador do grupo que passa seus dias investigando e identificando nazistas que vivem nos EUA. No meio das investigações e da caça, após aceitar a adição do jovem Jonah Heidelbaum (Logan Lerman), o grupo descobre um plano de erradicação genética tocado por um grupo de nazistas que acreditam na criação de um "Quarto Reich", plano este voltado principalmente para atingir as cidades interioranas dos EUA, mas que certamente ia afetar os moradores das grandes cidades.

A estética da série é maravilhosa, afinal de contas, anos 1970, né? Tem algumas atuações meio caricaturais, principalmente do personagem Lonny Flash, vivido pelo Josh Radnor (o Ted Mosby de How I met your mother), mas o alívio cômico está bem longe de incomodar a trama.

Aliás, arrisco dizer que boa parte do texto que faz paralelo com os dias de hoje traz uma leveza e uma ironia necessárias para a gente lidar com um tema tão pesado. Inclusive tem uma cena com o Lonny Flash e uma menininha negra nos ensinando a reconhecer um nazista que é sensacional. O texto, inclusive, é o ponto alto da série.

Não dá para assistir uma série que trata do nazismo sem fazer paralelos com nosso tempo atual. A suástica pode até estar em desuso (spoiler: se a gente prestar atenção, não está, ok?) mas certas atitudes estão em alta, desde a dúvida "será que ela é mesmo nazista?" quando um policial vê uma foto de uma cientista com uma suástica no jaleco enquanto CUMPRIMENTA O PRÓPRIO HITLER, até várias atitudes racistas dos nazistas da série - e se você não vê racismo nos ataques aos judeus brancos, fica tranquilo que a série quase sempre coloca um personagem negro pra te lembrar o quanto essa gente que preza pela tal pureza da raça ariana é podre.

Sem dar muitos spoilers, prestem atenção nos detalhes, como a música que toca enquanto Jonah sonha e vê a avó na época dos campos de concentração, as referências à Operação Paperclip - e a difícil discussão que pode surgir quando você descobre que alguns cientistas nazistas ajudaram o homem a chegar na Lua - ou então o quanto o psicopata da série (vivido pelo ator Greg Austin) utiliza a retórica nazista para dar vazão à sua psicopatia.

No fim, o balanço é positivo. A série trata de um assunto delicado e não perde tempo ao fazer vários paralelos com os tempos atuais - aliás, isso tem sido uma constante nas recentes produções do Jordan Peele - e vale muito a pena ser vista.

Para saber mais:

- A “caça” aos nazistas após a Segunda Guerra Mundial. Texto muito bom do Café História, explicando sobre os tais caçadores de nazistas do pós-guerra.

- A página da série no IMDb.

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