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As ordálias da Idade Média, ou “o juízo de Deus”

Representação de um combate judicial em Augsburg, datado do ano de 1409.


A origem das ordálias, ou ordálios, não remonta da época do Império Carolíngeo, como normalmente nós ouvimos por aí, mas ela é uma prática antiga que acabou ficando famosa durante a Idade Média — por isso a associação com o Império Carolíngeo.

A ordália consistia em submeter o(a) acusado(a) a um desafio para que ele(a), assim, provasse sua inocência, pois acreditava-se na intervenção divina durante a provação proposta, ou seja: se o(a) acusado(a) fosse inocente, Deus intercederia como em um milagre e a pessoa não sofreria as consequências do desafio imposto pela ordália.

E antes que alguém critique a Igreja Católica por esta prática, saibam que muitos papas e reis chegaram a condenar esta forma de justiça.


O juízo de Deus: As ordálias como prova de culpa ou inocência

Erroneamente as pessoas tem o costume de associar as ordálias à Idade Média ou ao catolicismo, mas a prática de submeter uma pessoa acusada de algum crime a uma prova — normalmente dolorosa ou perigosa —, que indicaria ou não sua inocência vem desde o Código de Hamurabi. A prática é bem mais antiga, mas é no Código de Hamurabi que nós temos o primeiro registro oficial, escrito, datado, de uma ordália.

Os DUELOS também serviam como ordálias. O vencedor era considerado inocente, enquanto ao perdedor sobrava a punição pelo crime.


A fama das ordálias na Idade Média deve-se talvez ao fato de que a prática tenha aparecido de forma romantizada na literatura, ou até mesmo usada como crítica ao catolicismo.

Outra crítica comum às ordálias nesta época é que o Direito Romano, estabelecido ainda no fim da Antiguidade, previa a apresentação de provas para a acusação de determinados crimes, o que pode ser considerado um avanço na prática jurídica. As ordálias então são classificadas como um retrocesso no sistema de leis da época.

Elas variavam de acordo com a região, mas as mais conhecidas são as seguintes:

— Provação pelo fogo:

O acusado deveria andar de três a nove passos segurando um ferro em brasa. Suas mãos eram enfaixadas e as pessoas esperavam três dias. Ao retirar as ataduras, se a ferida estivesse sarando, a pessoa era considerada inocente. Se a ferida apresentasse inflamação ou pouco avanço na recuperação dos ferimentos, a pessoa era considerada culpada.

— Provação pela água quente:

Bem parecida com a provação pelo fogo, esta ordália consistia em fazer a pessoa acusada mergulhar a mão em um caldeirão de água fervente. Mesmo raciocínio da cura indicando culpa ou inocência.

— Provação da cruz:

Duas pessoas ficavam frente a frente com os braços estendidos, tal qual Jesus na cruz. O que primeiro baixasse os braços era considerado culpado. Esta ordália em especial foi proibida pelo rei Luis I, o Pio, filho de Carlos Magno, pois ele considerava a prática uma blasfêmia a Jesus.

— Provação pelo duelo:

Já explicada na imagem acima. O duelo certamente ajudou a romantizar a prática e era usado para resolver também questões duvidosas de propriedade ou qualquer outra situação que deveria ser provada a alguém.

— Provação pela água gelada:

A pessoa ficava imersa, provavelmente só com a cabeça para fora de um lago com águas congelantes durante um certo tempo. Se saísse dali sem estar sofrendo muito com o frio, estava livre da acusação. Isso quando a pessoa não morria tentando provar a inocência! Uma variação da ordália fazia a pessoa ser amarrada e jogada em qualquer rio ou lago. Se ela boiasse, era culpada, já que segundo os acusadores, a água não receberia um corpo impuro, sujo com um crime. Esta ordália foi muito utilizada para culpar possíveis bruxas.

A prática das ordálias caiu em desuso com a chegada da época conhecida como Baixa Idade Média, por volta do ano 1100. Gradativamente as regiões que tinham este costume deixaram de lado as ordálias, substituindo por outros métodos de julgamento um pouco mais racionais e menos desumanos.

A Igreja contribuiu em parte com o fim da prática, já que existem registros de que a participação de membros da igreja nas ordálias foi proibida no IV Concílio de Latrão, em 1215. Sem o apoio do clero nas decisões, quem atestaria a intervenção divina e a culpa ou a inocência do(a) acusado(a)?

No entanto, quando o processo envolvia práticas hereges — como a bruxaria, por exemplo — a pessoa acusada podia sofrer torturas e até mesmo uma ordália durante seu interrogatório ou julgamento, de acordo com o Tribunal de Inquisição em que ela estava sendo julgada.

Apesar de perder importância na prática jurídica com o passar do tempo, as ordálias continuam vivas no Ocidente — pelo menos a ideia de provação.

Acostumou-se e chamar de ordália qualquer teste para uma pessoa entrar em alguma sociedade ou grupo restrito, como uma prova de que aquela pessoa está apta a fazer parte do grupo. Além disso, estas provações contemporâneas na maioria das vezes não causam dor ou desconforto físico para a pessoa que está cumprindo a ordália.

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