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O Livro dos Mortos

O Livro dos Mortos do Egito Antigo era uma coletânea de orações, feitiços, cânticos e, por que não dizer, obrigações que o morto deveria cumprir para ajudá-lo na viagem até o Além.

Só que nós não temos um livro, como nós conhecemos os livros hoje em dia. Ele é na verdade uma série de escritos e ilustrações compilados em papiros — e colocados ao lado das múmias — ou exposto nas paredes das câmaras mortuárias.

E o nome “Livro dos Mortos” advém dos saqueadores de tumbas, que — já em nossa época, século XIX e início do século XX — profanavam os túmulos em busca das riquezas históricas que poderiam encontrar dentro das câmaras. Como eram encontrados ao lado das múmias, os saqueadores chamavam os papiros de kitab al-mayitun, em árabe, ou “livro do defunto”.

Já os egípcios antigos costumavam chamar de “Livro de sair para a Luz” este conjunto de ensinamentos para a viagem até o Além. Ao todo, os arqueólogos e historiadores conseguiram identificar e catalogar 192 capítulos do livro, mas em nenhuma escavação ou pesquisa todos os 192 capítulos foram encontrados juntos, ou seja: o livro nunca foi encontrado por inteiro, e seu conhecimento está fragmentado em vários papiros e obras nos corredores e paredes das câmaras mortuárias.

Inicialmente os costumes eram passados de forma oral, mas os antigos egípcios acreditavam que os escritos foram passados a algum escriba pelo deus Thoth (também podemos escrever “Thot”, ok?), o deus-escriba.

Um destes fragmentos do Livro dos Mortos é o Papiro de Hunefer, e fala justamente do julgamento do morto. A partir desta imagem abaixo dá para explicar um pouco sobre o ritual do julgamento, segundo as tradições dos antigos egípcios:

Papiro de Hunefer, Novo Império, 19ª dinastia.

1) O defunto (à esquerda), vestido com uma longa túnica pregueada, é conduzido pelo deus Anúbis para junto da balança do julgamento.
2) O coração do defunto (seta branca), simbolizando seu pensamento e sua vida, é colocado em um dos pratos da balança enquanto no outro prato (seta vermelha) é colocado uma pluma, simbolizando o princípio do equilíbrio e da norma. Anúbis está de joelhos observando a pesagem enquanto o “grande devorador”, um animal representado por um leão com cabeça de crocodilo e anca de hipopótamo, está apenas aguardando a pesagem. Se o coração do morto for mais pesado que a pluma, quer dizer que sua vida não foi justa, e o “grande devorador” estraçalha o coração, destruindo a memória do defunto para sempre.
3) O deus Thoth também observa a pesagem e aguarda para registrar o resultado do julgamento.
4) Com o resultado justo, o deus Hórus leva o defunto até a presença de Osíris, retratado no papiro como uma múmia usando a coroa ritual (atef), segurando o cetro (heka) e o chicote (flagellum). Atrás de Osíris estão as deusas Ísis e Néftis. [1]

É bom citar que estes escritos — assim como os rituais funerários egípcios mais elaborados — eram colocados apenas nos túmulos dos egípcios de alta classe social: os escribas, sacerdotes e membros da família real.

Com relação aos papiros e pinturas, na internet nós temos algum material relativo a isto. Por exemplo: Uma sessão do Papiro de Ani, ou do Papiro de Nebqed podem ser encontrados com facilidade — lembrando que o papiro normalmente é nomeado com o escriba que o compilou e identificou o mesmo, ou seja, o Papiro de Nebqed foi escrito pelo próprio Nebqed.

Referências

[1] Texto elaborado a partir da descrição do Papiro de Hunefer que consta na revista Larousse das Civilizações Antigas. Volume I — Dos faraós à fundação de Roma, p. 56.

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